quarta-feira, 30 de março de 2011

Marcelo Câmara: o amadeiramento e o veneno


O Globo, 21 de março de 2011, traz esta nota muito simpática sobre o meu trabalho de cachaçólogo e degustador, ofícios que exerço há mais de quarenta anos. Quase tudo certo com a nota do meu colega Joaquim Ferreira dos Santos. Apenas uma correção: eu não abri consultoria. Apenas reativei plenamente, consultoria de vários serviços profissionais que presto há quase vinte anos.

Marcelo Câmara



Sua Excelência, a Cachaça, uma das mais belas expressões da Cultura Brasileira e um importante produto da nossa economia há mais de quatro séculos, tem raras vitórias contra a insistente inhaca, o amadeiramento calhorda e o veneno latente. Atualmente, é uma façanha hercúlea, um milagre até, encontrar no mercado brasileiro e internacional, Cachaça (nova: fresca ou “descansada”) “pessoalmente” e Cachaça Envelhecida (em suas variadas idades), “pessoalmente”, duas bebidas diversas, com excelência sensorial. Isto é, cachaças que podem receber, na minha avaliação, notas acima de 8 (oito), cachaças com aroma agradável de bagaço de cana-de-açúcar (de melado ou rapadura) e com o sabor delicioso e único do destilado nacional. São seis mil marcas ativas no mercado nacional e pouquíssimas, talvez uma dezena de marcas de Cachaças e outra dezena de Cachaças Envelhecidas que apresentam verdadeiras virtudes sensoriais: o fascinante aroma e o gosto rústico e peculiar da cachaça, essa exuberância sensorial virtuosa, forte e inebriante que encanta os estrangeiros e faz tremer as grandes corporações que produzem os outros destilados como a vodca, o rum, o uísque e o hegemônico soju, à base de arroz coreano. As cachaças tem cheiro e gosto de tudo – álcool anidro, madeira, cereal, ervas, frutas, loção pós-barba, conhaque e uísque falsos, perfume barato, água de colônia, remédio, protocolo do INSS guardado – menos o legítimo perfume e gosto de cachaça, de cana.

Noventa e nove por cento das marcas são medianas ou ruins, não são saborosas. Três são os recursos criminosos normalmente utilizados pela grande maioria que fabrica produtos imbebíveis, e quer vender a sua cachaça nauseabunda. O primeiro consiste em tingi-la com madeiras agressivas, amadeirar criminosa e sordidamente, ao máximo, a cachaça, transformá-la numa mistura de etanol e serragem a fim de esconder a inhaca original e dissimular o seu terrível fedor e sabor de veneno. O outro é criar embalagens luxuosas e escrever no rótulo que tem quatro, seis, oito anos de ‘”envelhecimento”. Por último, estabelecer preços altíssimos, irreais, exorbitantes. Estas são as três formas vigentes de enganar, de ludibriar o pingófilo, ignorante, iniciante ou acostumado a beber mal.

Quem sabe fazer e envelhecer cachaça com sabedoria e arte, cachaça com qualidade química e, principalmente, com excelência sensorial, nada teme, nada tem a esconder, e vende os dois tipos da bebida: a nova e a envelhecida. Nenhuma cachaça permanece cachaça, mantém a sua natureza, preserva as características sensoriais próprias da bebida, se passa de quatro, cinco, seis anos armazenada em madeira, mesmo apropriada e tratada. Nenhuma das dez Cachaças de excelência que possivelmente existem ou nenhuma das dez Cachaças Envelhecidas de excelência que possivelmente existem tem perfume e sabor estranhos, esdrúxulos, que não sejam o de cana. Nenhuma delas possui embalagem sofisticada ou custa mais que cinquenta reais. A dica para quem quer se iniciar na degustação: “O olfato é a antessala do paladar. Se a cachaça não tem o perfume peculiar e característico da cana, do bagaço da cana, que remete ao melado, à rapadura ou ao manuê-de-bacia (bolo feito de melado) – pode desprezar. Não é pinga boa".





Marcelo Câmara é autor dos livros:
Cachaça – Prazer Brasileiro (Mauad, Rio, 2004)
Cachaças bebendo e aprendendo – guia prático de degustação / Drinking and learning – Practical guide to tasting (Mauad, Rio, 2006)


domingo, 27 de março de 2011

MAIS UMA DOSE


Produzida e engarrafada pela destilaria Corisco de Paraty Ltda, localidade do Corisco, Paraty, RJ, a cachaça Corisco fabricada em outubro de 2007 apresenta um rótulo simples, agradável e funcional, a garrafa de 900 ml tem um formato comum, clássico. É uma cachaça nova, com 46% de graduação alcoólica.

A aparência é ótima, mostra grande viscosidade escorrendo pela borda do copo lentamente. O aroma de cana levemente adocicado característico da pinga nova. O gosto é robusto com uma leve acidez no final, retrogosto presente.

A capa do disco de vinil (Chico Buarque - Almanaque) ao fundo foi um presente do amigo Juvenal.

Salve Juvenal.


Preço: R$ 44,90

Foto: Cavic